sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Os verdadeiros guardiões das florestas - Artigo sobre guarda-parques

André Ilha - 08/01/15

Combate-a-incendio-florestal-diurno-Foto---arquivo-INEAGuarda-parques combatendo incêndio florestal. Foto: Arquivo INEA
O documento "Pilares para o Plano de Sustentabilidade Financeira do Sistema Nacional de Unidades de Conservação", publicado pelo Ministério do Meio Ambiente em 2007, cita estudos no exterior que demonstram que para a conservação de áreas protegidas, a densidade de pessoal de campo é um fator mais efetivo do que qualquer outro tomado individualmente.
Não há qualquer surpresa nesta constatação. Ela apenas corrobora o que usuários, técnicos e pesquisadores já sabiam há muito tempo: para que um parque ou outra unidade de conservação (UC) qualquer possa ser promovido da abstração bem intencionada do ato legal que o instituiu para a sua materialização no mundo real, é necessária a presença no campo de servidores bem treinados, equipados, uniformizados e, sobretudo, identificados com os seus objetivos. Servidores que interajam rotineiramente com visitantes, pesquisadores e moradores e que monitorem e zelem pelo seu patrimônio natural, físico e cultural. Portanto, que sirvam de ligação entre a UC e o seu entorno físico e simbólico, fazendo com que ela não seja vista como um corpo estranho no tecido social onde está inserida. Esse profissional, por excelência, é o guarda-parque, uma carreira bem definida e consolidada em muitos países, mas que ainda engatinha no Brasil.
Guarda-parques no Brasil
"(...) a terceirização de atividades no serviço público é essencialmente precária, e a norma nestes casos foi a descontinuidade dos serviços, causando uma enorme frustração"
Alguns estados brasileiros criaram temporária ou permanentemente um corpo próprio de guarda-parques, mas a maioria apresentou equívocos conceituais importantes em sua concepção.
Em alguns casos, foram chamados de guarda-parques servidores terceirizados que, de fato, desempenhavam muitas das atribuições destes profissionais. Ocorre que a terceirização de atividades no serviço público é essencialmente precária, e a norma nestes casos foi a descontinuidade dos serviços, causando uma enorme frustração nos demitidos e também nos dirigentes dos órgãos ambientais, que contavam com essa força de trabalho para cuidar das áreas protegidas sob sua tutela. Além disso, por não serem concursados, tais profissionais não dispunham de competência legal para lavrar autos e termos diversos, tornando capenga a sua atuação.
Chamar voluntários de guarda-parques, como também já se viu, é ainda pior, pois sem haver sequer um vínculo empregatício formal com a instituição gestora da UC, é no mínimo temerário atribuir-lhes tal responsabilidade em nome do Estado. Voluntários podem contribuir muito com a gestão de parques e áreas afins, mas é importante deixar claro o seu papel até devido a possíveis repercussões legais que uma equivocada interpretação nesse sentido poderia gerar.
Uma importante unidade da federação denominou de guarda-parques todos os servidores a seu serviço, do bilheteiro ao chefe da unidade. Isso desvirtua o papel de cada um, agravado pelo fato de incluir servidores concursados e empregados terceirizados no mesmo pacote. Não se pode, por exemplo, chamar a todos os que trabalham em um hospital – diretores, médicos, enfermeiros, maqueiros, motoristas etc. – de uma coisa só, como "guardiões da saúde", por exemplo. Uma vez mais, há zonas de sobreposição de atividades entre alguns destes cargos, mas isto não justifica a dissolução arbitrária dos limites entre as diversas categorias funcionais. Todas essas disfunções só servem para confundir, e conspiram contra o objetivo de vermos implantada, enfim, no Brasil, a autêntica filosofia que rege os corpos de guarda-parques mais consagrados em todo o mundo.
No plano federal a situação é ainda pior, pois apesar de o Instituto Chico Mendes para a Conservação da Biodiversidade (ICMBio) ser o órgão responsável pela gestão de mais de 400 unidades de conservação espalhadas por todo o território nacional, cuja importância ambiental conjunta tem uma dimensão planetária, inacreditavelmente não conta, até hoje, com um corpo próprio de guarda-parques.
O papel dos guarda-parques
Manejo-de-trilha-no-Parque-Estadual-Cunhambebe-Foto---Arquivo-INEAManejo de trilha no Parque Estadual Cunhambebe. Foto: Arquivo INEA
"Eles são servidores de estado, concursados, aptos a desempenhar uma série de atividades voltadas à proteção e gestão de parques e, por extensão, de outras UCs"
Mas, afinal, o que são, ou, por outra, o que devem ser os guarda-parques?
Guarda-parques são servidores de estado, concursados, aptos a desempenhar uma série de atividades voltadas à proteção e gestão de parques e, por extensão, de outras unidades de conservação ambiental. Estas atividades podem variar de caso a caso, mas giram em torno dos seguintes eixos temáticos: 1) fiscalização; 2) prevenção e combate a incêndios florestais; 3) ordenamento do uso público; 4) interpretação e educação ambiental; 5) busca e salvamento; 6) manutenção de trilhas e instalações; 7) apoio à pesquisa científica; e 8) administração. Tratemos brevemente de cada tema:
Fiscalização – É a atividade que dá nome à carreira. Trata-se de zelar pela integridade do patrimônio natural e cultural das UC e adotar as medidas necessárias caso seja observada alguma infração administrativa. A competência constitucional para a repressão de crimes é da polícia, e para melhor atender a outras importantes atribuições como ordenamento do uso público e educação ambiental, os guarda-parques, idealmente, deveriam atuar desarmados. Contudo, em certas situações elas podem ser necessárias para garantir a sua integridade física do agente, como instrumento de defesa pessoal, especialmente quando não for viável o suporte imediato de força policial.
Prevenção e combate a incêndios florestais – Os incêndios florestais são a principal e mais drástica causa de destruição dos ecossistemas nativos brasileiros. Preveni-los e combatê-los prontamente é uma das mais fundamentais atribuições dos guarda-parques. Embora a competência primária para o combate a incêndios seja dos corpos de bombeiros, os órgãos gestores de unidades de conservação podem desempenhar esta tarefa nos seus limites e no entorno imediato. Primeiro, minimizando ocorrências com um trabalho preventivo e, na época crítica, mantendo vigilância constante e dando uma pronta resposta caso um foco seja identificado, impedindo que se alastre descontroladamente.
Ordenamento do uso público – Parques são Unidades de Conservação que visam tanto à preservação das espécies e dos ecossistemas nativos quanto à recreação, a educação ambiental e o turismo, especialmente o chamado turismo ecológico. Para atender a esta segunda função, quem tem a missão precípua de aplicar as políticas de uso público traçadas para cada atrativo e para cada segmento de usuários é o guarda-parque. Isto se torna ainda mais relevante quando nos lembramos de que é vital para o próprio futuro das áreas protegidas que parcelas crescentes da população as conheçam, entendam a sua importância e se engajem permanentemente na sua defesa e manutenção. Nesse sentido, os guarda-parques podem ser considerados como autênticos relações-públicas das áreas protegidas.
Interpretação e educação ambiental – Embora confundam-se em parte com o item anterior, estas atividades merecem destaque devido às oportunidades únicas que as unidades de conservação oferecem para proporcionar à população uma maior compreensão do funcionamento dos processos físicos e biológicos naturais e a estabelecer a sua conexão com o nosso próprio bem-estar.
Busca e salvamento – Outra atribuição de competência primária dos corpos de bombeiros, mas é de todo desejável que os guarda-parques estejam preparados e equipados para exercê-la num primeiro momento. Isso é especialmente válido para a busca de perdidos e a estabilização de feridos. O salvamento em si dependerá da sua complexidade, podendo ser necessária a ajuda dos bombeiros.
Manutenção de trilhas e instalações – O cuidado rotineiro com as instalações físicas de um parque, bem como de trilhas e outras estruturas de suporte ao uso público, também são tarefas universalmente desempenhadas pelos guarda-parques. Contudo, as atividades de conservação e limpeza de edificações e de manutenção predial devem estar a cargo de profissionais próprios, e intervenções físicas de maior magnitude requerem a contratação de serviços específicos.
Apoio à pesquisa científica – Uma das finalidades de qualquer UC é permitir o aumento do conhecimento científico sobre os aspectos bióticos e abióticos que ela encerra. Na medida do possível, sua equipe deve oferecer suporte logístico aos pesquisadores e, embora não o único, o guarda-parque é o principal candidato a desempenhar este papel.
Administração – As tarefas administrativas indispensáveis ao adequado funcionamento de um parque não podem ser negligenciadas, e os guarda-parques podem dar a sua contribuição eventual ou permanente, dependendo das circunstâncias. Entretanto, como não é possível que outros servidores desempenhem algumas das funções inerentes aos guarda-parques, por exigirem formação apropriada, então o recurso à sua utilização em atividades administrativas deve ser o menor possível.
A experiência do Rio de Janeiro
Operacao-de-resgate-e-apoio-as-vtimas-dos-temporais-de-2011-na-Regiao-Serrana-do-RJ-Foto---Arquivo-INEAOperação de resgate e apoio às vítimas dos temporais de 2011, na Região Serrana do RJ. Foto: Arquivo INEA
"(...) a ideia era provar para o Rio de Janeiro e para o restante do país que não há comparação possível entre a gestão de uma UC com e sem guarda-parques"
Após a criação, em janeiro de 2009, do Instituto Estadual do Ambiente (INEA), a gestão ambiental do estado deu um salto extraordinário em todas as suas agendas. Na Agenda Verde, os destaques se deram em campos como ampliação da área protegida, regularização fundiária, mecanismos financeiros para financiamento da gestão das UC, planos de manejo e outros. Mas uma das medidas que teve impactos mais positivos foi precisamente a criação do Serviço de Guarda-Parques.
Uma primeira tentativa em parceria com o Corpo de Bombeiros fracassou, mas mesmo assim conseguiu-se que 60 bombeiros militares fossem cedidos ao INEA para exercer a função em caráter pioneiro no estado. O comprometimento desse grupo e a excelência do serviço prestado provou o acerto da iniciativa, e em 2010 foi realizado um processo de seleção pública para a contratação, por prazo determinado, de 220 guarda-parques civis para o órgão. As atribuições profissionais previstas no novo decreto estão em perfeita consonância com os princípios acima mencionados, e o sucesso em criar, talvez pela primeira vez no Brasil, um grande e doutrinariamente consistente corpo de guarda-parques, justifica que analisemos rapidamente algumas de suas características.
Foi estipulado o segundo grau completo como requisito mínimo de escolaridade, pois o nível elementar dificultaria, ou mesmo impossibilitaria, o desempenho de algumas atividades pelos concursados. Já o superior teria um custo proibitivo – sem falar nos desafios de se ordenar a bacharéis que limpassem aceiros ou consertassem cercas. Além de os aprovados terem demonstrado um excelente aproveitamento no curso de formação, havia diversos deles com nível de escolaridade superior, que abdicaram de empregos com remuneração maior em troca da chance de trabalharem diretamente com as áreas naturais protegidas. A paixão pelo trabalho e o comprometimento demonstrado no dia a dia foram fundamentais para que o Serviço de Guarda-Parques do INEA conquistasse o respeito e a admiração de todos aqueles que de alguma forma lidam com as Unidades de Conservação estaduais fluminenses.
Um aspecto da maior importância é que as vagas foram abertas por unidade de conservação. Assim, obteve-se um elevado nível de absorção de mão de obra local, o que resultou em dois benefícios evidentes: menor pressão para transferências para unidades na capital ou próximas a ela e, sobretudo, uma maior inserção das UC com as comunidades do entorno ou nos arredores. Isso favorece a elaboração e aplicação de políticas de relacionamento realistas com estes habitantes, parte legitimamente interessada no processo de criação e implantação de uma Unidade de Conservação vizinha.
A inexistência de um curso prévio de formação para guarda-parques fez com que o INEA se responsabilizasse por todo o processo de formação dos concursados, o que não foi o ideal. Mas há agora um projeto de lei federal em tramitação regulamentando a profissão no Brasil, que exige que os candidatos a um concurso já tenham concluído um curso de formação com duração mínima de 200 horas, reconhecido pelo MEC. Depois cada órgão contratante pode aprofundar o treinamento ou proporcionar cursos voltados para uma habilidade específica qualquer.
Não foram medidos esforços no equipamento deste contingente de 220 guarda-parques civis, que se somaram aos 60 homens cedidos pelo Corpo de Bombeiros. Uniformes, equipamentos de proteção individual, de combate a incêndios, de camping, tudo foi pensado e adquirido com a melhor qualidade possível. Mais do que meramente receber um novo grupo de servidores no órgão, a ideia era provar para o Rio de Janeiro e para o restante do país que não há comparação possível entre a gestão de uma UC com e sem guarda-parques, e o resultado não poderia ter sido mais satisfatório. Os guarda-parques do Rio de Janeiro não só promoveram uma revolução em termos de eficiência de gestão das unidades de conservação como também se destacaram como força suplementar aos bombeiros nas grandes calamidades que afligiram o estado desde então. Pequenas missões de interesse comunitário, como a desobstrução de estradas secundárias interrompidas por deslizamentos de terra ou queda de árvores, e o resgate de animais silvestres em residências para devolvê-los ao seu habitat natural, ajudaram a consolidar uma imagem positiva dos guarda-parques – um ativo imaterial de valor inestimável.
Por todo o exposto, podemos dizer que a criação de um bem treinado e equipado, e doutrinariamente consistente Serviço de Guarda-Parques no INEA foi um sucesso, e é impensável que as unidades de conservação estaduais do Rio de Janeiro venham a ficar sem estes profissionais no futuro. Há inclusive um projeto de lei estadual em tramitação criando 400 vagas definitivas na estrutura do órgão, que se aprovado abrirá postos para um efetivo compatível com a extensão e a complexidade das áreas protegidas estaduais fluminenses.
Esfera Federal
Veculos-e-equipamentos-em-quantidade-e-qualidade-equipam-o-Servio-de-Guarda-Parques-do-INEA-Foto---Andr-IlhaVeículos e equipamentos em quantidade e qualidade equipam o Serviço de Guarda-Parques do INEA. Foto: André Ilha
"É imprescindível que o ICMBio tenha condições de colocar em campo, o mais rápido possível, guarda-parques em número suficiente para zelar pelas centenas de UCs de norte a sul do país"
Não há como se falar seriamente na gestão de parques sem contar com estes profissionais na ponta. É necessário que no Brasil, definitivamente, se implante uma cultura sólida de cuidado com as suas áreas protegidas através da contratação, formação e, finalmente, atuação de guarda-parques. Se estamos relativamente bem no percentual de áreas protegidas em relação ao território total do país, estamos péssimos na manutenção destas áreas, e não é mais possível adiar o enfrentamento deste problema.
Diversos estados mostraram, de forma mais ou menos estruturada, desejo de cumprir com a sua parte, e os eventuais problemas observados decorrem até da novidade do conceito e podem ser ajustados.
Mais preocupante, contudo, é a situação na esfera federal. É imprescindível que o ICMBio tenha condições de colocar em campo, o mais rápido possível, guarda-parques em número suficiente para zelar pelas centenas unidades de conservação federais de norte a sul do país, refúgio de uma diversidade biológica estonteante e duramente ameaçada. E que, quando o fizer, não cometa o equívoco de lançar este contingente contra potenciais aliados, como visitantes e moradores, salvo nos casos de flagrante transgressão das normas ambientais. Guarda-parques foram projetados para conquistar aliados, e não colecionar inimigos. A falha em entender este fato pode resultar catastrófica numa época em que o conservadorismo e a mentalidade patrimonialista aumentaram ainda mais a sua representação no Congresso Nacional.
O-autor-em-2010-com-o-primeiro-grupo-de-guarda-parques-do-Parque-Estadual-dos-Tres-Picos-Foto---arquivo-INEAO autor, em 2010, com o primeiro grupo de guarda-parques do Parque Estadual dos Três Picos. Foto: Arquivo INEA

*Artigo editado em 10.01.2015 às 12h28

Banco Público de Áreas para Restauração – BANPAR


Mensagem de divulgação do Banco Público de Áreas para Restauração - BANPAR, uma iniciativa da GESEF com o intuito de aproximar proprietários de terras e empreendedores que possuem compromissos de restauração que pretende minimizar o gargalo existente no que se refere à falta de áreas para as empresas cumprirem seus compromissos de restauração florestal.

"O INEA lançou no final de 2014 o Banco Público de Áreas para Restauração – BANPAR. A iniciativa aproxima proprietários de terras interessados em aumentar a cobertura florestal de suas propriedades e empreendedores com compromissos de reflorestamento.

Os ganhos para os proprietários são o atendimento as exigências do novo código florestal, atingimento dos percentuais mínimos de vegetação exigidos no CAR, venda de cotas de reserva florestal, dentre outros.

A inscrição no sistema é gratuita para proprietários, posseiros ou gestores de áreas públicas, não representando compromisso formal e nem quaisquer obrigações decorrentes dos custos da restauração florestal. O banco de áreas pode ser acessado e consultado através do portal do Inea no seguinte endereço:



Documentário: Lixo - Um problema global

         

Documentário, produzido por Jeremy Irons e lançado em 2012, Lixo - Um problema global, discute o grande problema que é a geração e o descarte constante e incorreto de resíduos recicláveis e orgânicos, pelo homem e os efeitos devastadores que isto está trazendo, não só de poluição, mas de contaminação dos animais marinhos, dos mares, e do próprio ser humano. O filme discute também o efeito nocivo do plástico para a saúde humana.
O documentário mostra que o mundo, principalmente os mares, estão completamente tomados por lixo plástico, por resíduos sólidos, por milhares e milhares de micro fragmentos de sacolinhas, filmes de PVC e tudo o mais, que transforma áreas enormes de TODOS os oceanos numa sopa difusa que contém mais desses fragmentos por área do que microplânctons
O filme mostra também que o plástico é uma substância altamente tóxica, que tem a capacidade de atrair e aglutinar outras toxinas presentes no ambiente. E que os animais marinhos de uma forma ou de outra, estão consumindo estes plásticos e portanto se contaminando. Desde lulas, camarões, lagostins até focas e baleias. E que estas toxinas não são eliminadas, pelo contrário se acumulam na cadeia alimentar, passando para os comedores, inclusive ou últimos da cadeia, que somos nós.

Assista ao documentário no link:

http://gnt.globo.com/programas/gntdoc/videos/3863464.htm

São José vai ‘blindar’ nascentes dos rios

Das 39 cidades da região, 32 fazem parte da bacia do rio Paraíba. Foto: Claudio Vieira



Prefeitura lança em março o primeiro edital do programa que vai remunerar pequenos produtores rurais para que atuem como ‘guardiães’ dos recursos hídricos; zona norte será a primeira região contemplada
Xandu AlvesSão José dos Campos
A implantação de programas de PSA (Pagamento por Serviços Ambientais) na Região Metropolitana do Vale do Paraíba terá um impulso em 2015, com o término de um estudo sobre o tema e o lançamento do primeiro edital do programa em São José.
Atualmente, o programa está implantado e em operação apenas em Guaratinguetá e São Luís do Paraitinga.
Em São José o programa já foi regulamentado por lei municipal, mas ainda não está em operação. A expectativa da Secretaria de Meio Ambiente é lançar o edital em março.
A partir daí, pequenos e médios produtores rurais da bacia do ribeirão das Couves, primeira região da cidade a receber o programa, na zona norte, poderão se inscrever para receber um incentivo em dinheiro em troca de preservação.
Segundo Ricardo Novaes, diretor de Planejamento da Secretaria de Meio Ambiente de São José, as regras do edital estão sendo finalizadas. Elas apontarão as diretrizes para definir as áreas, o tamanho delas e o valor a ser remunerado.
“Pretendemos lançar o edital no Dia Mundial da Água, em 22 de março de 2015. Estamos fechando as questões jurídicas e os detalhes das regras”, afirmou. “A meta é assinar os primeiros contratos até junho”.

Água. O PSA é apontado pelo Ministério do Meio Ambiente como uma das ferramentais mais úteis para preservar mananciais de água, recuperar áreas de floresta e proteger as nascentes de rios.
O programa chega com força à região após o ano mais seco da história das represas, com possibilidade de 2015 repetir a estiagem do ano anterior, o que exigiria ainda mais ações compensatórias.
Em São José, segundo Novaes, a meta do PSA é restaurar mais de 53 hectares de áreas de preservação que estão degradadas e comprometem a produção de água no período de dois anos.
“Por isso, apostamos em parcerias ambientais sustentáveis. Esse é o grande mote do programa”, completou a secretária de Meio Ambiente de São José, Andréa Francomano.
“O programa será o grande indutor da zona rural visando a preservação ambiental.”

Região. Com recursos do Fehidro (Fundo Estadual de Recursos Hídricos), o Instituto Oikos de Agroecologia, de Lorena, finaliza um estudo de dois anos que antecederá a implantação do PSA em toda a região.
A expectativa da organização é apresentar o estudo neste mês de janeiro.
Segundo a geóloga Alexandra Andrade, coordenadora técnica do projeto e coordenadora executiva do Oikos, o estudo mostrará quais as áreas na bacia que deverão receber o PSA. São analisadas 34 mananciais públicos na bacia, com afluentes do rio Paraíba, que envolvem 21 cidades em toda a região do Vale do Paraíba.
“Tem que priorizar, não dá para implantar em todas as áreas ao mesmo tempo. É isso o que mostrará o estudo que o Oikos está finalizando”, disse Alexandra.
Para ela, investir no PSA é apostar na qualidade de vida e bem estar da população, além da preservação ambiental e da produção de água.
Com o estudo pronto, segundo a geóloga, as cidades da região terão uma base técnica para implantar o PSA em seus territórios.



Custo por hectare pode chegar a R$ 30 mil

São José dos Campos
O proprietário rural Antonio Carlos de Carvalho Braga, 69 anos, é um dos primeiros na lista para aderir ao programa de PSA (Pagamento por Serviços Ambientais) em São José dos Campos.
Ele tem uma área de 112 hectares no distrito de São Francisco Xavier, região escolhida pela prefeitura para iniciar a implantação do PSA.
“Toda aquela região tem água. Estou no encosto da Serra da Mantiqueira, na divisa com Minas Gerais. Há rios e cursos d’água nascendo nessa área que precisam ser protegidos”, disse Braga.
Para ele, os proprietários rurais não têm condição financeira de investir em programas de reflorestamento e de recuperação de mata ciliar.
“O custo é muito alto e os pequenos produtores não tem como arcar. O dinheiro que virá pelo PSA será fundamental para garantir essa preservação”, afirmou.
A conta que ele faz é de R$ 30 mil por hectare para a recuperação da mata, por um período de dois anos.
“A saída para a zona rural do Vale é ser uma região produtora de água. E para isso temos que estabelecer o PSA”, disse o ambientalista Lincoln Delgado. “Fica mais barato que fazer estações e mais estações de tratamento de água”.
Fonte: http://www.ovale.com.br/s-o-jose-vai-blindar-nascentes-dos-rios-1.578328

Inscrições abertas para prêmio de biodiversidade



Paulo Araújo/MMA
Conservação das espécies da fauna e da flora brasileira



















Para participar, os interessados devem preencher formulário online
Concurso é destinado a órgãos públicos, iniciativa privada, imprensa, terceiro setor 
e público em geral

Por: Lucas Tolentino – Edição: Vicente Tardin
Estão abertas, até 13 de fevereiro de 2015, as inscrições para o Prêmio Nacional da Biodiversidade.
Instituída pelo Ministério do Meio Ambiente (MMA), a premiação reconhecerá ações e projetos que se
destacaram pela conservação das espécies da fauna e da flora brasileira. A previsão é que os
vencedores sejam divulgados em cerimônia marcada para 22 de maio de 2015.
O prêmio se divide em sete categorias e cada trabalho só pode ser inscrito em apenas uma delas.
As categorias são:
  • organizações não-governamentais,
  • empresas, sociedade civil (associações e cooperativas, entre outros),
  • academia (pesquisadores e instituições voltadas à produção científica e tecnológica),
  • órgãos públicos de todas as esferas,
  • imprensa (jornais, revistas, rádios televisão e internet) e
  • individual, destinada a ações desempenhadas por cidadão de maneira independente.

A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, afirmou que a premiação tem o objetivo de promover novas práticas na área de biodiversidade. “A expectativa é que esse seja o principal prêmio ambiental do país e ajude a alavancar boas iniciativas”, declarou.
FORMULÁRIO
As inscrições serão realizadas somente por meio do preenchimento de formulário
online, pelo endereço http://pnb.ana.gov.br, com anexação de documentos.
Os órgãos, entidades e instituições interessados podem protocolar mais de um trabalho, desde que cada
um deles seja inscrito em apenas uma categoria. Não serão aceitas trocas, alterações, inserções ou
exclusões de parte ou da totalidade do material complementar após o término das inscrições.
A comissão julgadora será formada por pessoas de notório saber em temas relacionados à área de
conservação e por um representante da Secretaria de Biodiversidade e Florestas do MMA, que a presidirá,
porém sem direito a voto.
Os critérios de avaliação incluem efetividade quanto ao estado de conservação da espécie, impactos
ambientais e sociais e inovação.
Em cada categoria, os três melhores trabalhos serão classificados como finalistas. O vencedor receberá o
Troféu Prêmio Nacional de Biodiversidade e os segundos e terceiros colocados levarão o certificado de
finalista do concurso.
As iniciativas finalistas também concorrerão ao prêmio Júri Popular, que será eleito por meio de votação
eletrônica no site do MMA. 
Leia aqui mais detalhes sobre o Prêmio Nacional da Biodiversidade.
Assessoria de Comunicação Social (Ascom/MMA) - Telefone: 61.2028 1227

Dança da chuva - A escassez de água que alarma o país tem relação íntima com as florestas

 
A Amazônia não é apenas a maior floresta tropical que restou no mundo. Esse sem-fim de verde entrecortado por rios serpenteantes de tamanhos e cores variados também não se limita a ser a morada de uma incrível diversidade de animais e plantas. A floresta amazônica é também um motor capaz de alterar o sentido dos ventos e uma bomba que suga água do ar sobre o oceano Atlântico e do solo e a faz circular pela América do Sul, causando em regiões distantes as chuvas pelas quais os paulistas hoje anseiam. Mas o funcionamento dessa bomba depende da manutenção da floresta, cuja porção brasileira, até 2013, perdeu 763 mil quilômetros quadrados (km2) de sua área original, o equivalente a três estados de São Paulo. Antonio Donato Nobre, pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), não aponta o dedo para culpados. O que importa para ele é reverter esse processo e não apenas zerar o desmatamento, mas recuperar a floresta. No relatório O futuro climático da Amazônia, divulgado no fim de outubro, ele deixa claro que o único motivo para não se tomarem providências imediatas para reduzir o desmatamento é desconhecer o que a ciência sabe. Para ele, o caminho é conscientizar a população. “Agora é um bom momento porque as torneiras estão secando”, afirma.
No relatório, elaborado a partir da análise de cerca de 200 trabalhos científicos, ele mostra que a cada dia a floresta da bacia amazônica transpira 20 bilhões de toneladas de água (20 trilhões de litros). É mais do que os 17 bilhões de toneladas que o rio Amazonas despeja no Atlântico por dia. Esse rio vertical é que alimenta as nuvens e ajuda a alterar a rota dos ventos. Nobre explica que os mapas de ventos sobre o Atlântico mostram que, no hemisfério Sul e a baixas altitudes, o ar se move para noroeste na direção do equador. “Na Amazônia a floresta desvia essa ordem”, diz. “Em parte do ano, os ventos alísios carregados de umidade vêm do hemisfério Norte e convergem para oeste/sudoeste, adentrando a América do Sul.”
Essa circulação viola um paradigma meteorológico que diz que os ventos deveriam soprar das regiões com superfícies mais frias para aquelas com superfícies mais quentes. “Na Amazônia, o ano todo eles vão do quente, o Atlântico equatorial, para o frio, a floresta”, explica. Uma parceria com os russos Anastasia Makarieva e Victor Gorshkov, do Instituto de Física Nuclear de Petersburgo, tem ajudado a explicar do ponto de vista físico os fenômenos meteorológicos da Amazônia. Em artigo publicado em fevereiro de 2014 no Journal of Hydrometeorology, eles afirmam, com base em análises teóricas confirmadas por observações empíricas, que o desmatamento altera os padrões de pressão e pode causar o declínio dos ventos carregados de umidade que vêm do oceano para o continente. O grupo analisou os dados de 28 estações meteorológicas em duas áreas do Brasil e viu que os ventos que vêm da floresta amazônica carregam mais água e estão associados a maiores índices de chuvas do que ventos que partem de áreas sem floresta e chegam à mesma estação.
Isso acontece, segundo os pesquisadores, por causa da bomba biótica de umidade, uma teoria proposta pela dupla russa em 2007 para explicar a dinâmica de ventos impulsionada por florestas. Essa ideia completa a descrição feita pelo  climatologista José Antonio Marengo, à época pesquisador do Inpe, de como a Amazônia exporta chuvas para regiões mais meridionais da América do Sul. A teoria da bomba biótica aplica uma física não usual à meteorologia e postula que a condensação da água, favorecida pela transpiração da floresta, reduz a pressão atmosférica que suga do mar para a terra as correntes de ar carregadas de água.
018-025_CAPA-Aguas_226Os fundamentos da influência da condensação sobre os ventos foram apresentados em artigo publicado em 2013 por Anastasia e Gorshkov, em parceria com Nobre e outros colaboradores, na Atmospheric Chemistry and Physics, uma das revistas mais importantes da área. Por meio de uma série de equações, eles mostram que o vapor de água lançado à atmosfera pela transpiração da floresta gera, ao condensar, um fluxo capaz de propelir os ventos a grandes distâncias. De acordo com Nobre, a nova física da condensação proposta por eles gerou, ainda durante a revisão do artigo, uma controvérsia com meteorologistas, que debateram o assunto furiosamente em blogscientíficos com a intenção de derrubar a principal equação do trabalho. Não conseguiram e o trabalho foi publicado. O pesquisador do Inpe explica a polêmica. “É uma física que atribui à condensação, um fenômeno básico e central do funcionamento atmosférico, um efeito oposto ao que se acreditava”, diz. “Será necessário reescrever os livros didáticos da área.”
Para dar a dimensão da dificuldade de diálogo entre físicos teóricos e meteorologistas, Nobre lembra que a física desenvolve um entendimento dos fenômenos atmosféricos a partir de leis fundamentais da natureza, enquanto a meteorologia o faz, em grande parte, com base na observação de padrões do clima do passado, cuja estatística é absorvida em modelos matemáticos. Tais modelos representam bem as flutuações climáticas observadas, mas apresentam falhas quando há alterações significativas no padrão.
É o caso agora, quando um novo contexto – ocasionado por desmatamento, mudanças globais no clima ou outros fatores – gera fenômenos climáticos inesperados para certas regiões, como chuvas mais torrenciais e secas mais extensas. A teoria física acerta onde extrapolações do passado erram, por isso é preciso, segundo ele, construir novos modelos climatológicos que recoloquem a física no centro dos esforços da meteorologia.
O momento agora é crucial porque o clima amazônico vem mudando. Secas importantes nessa região marcaram os anos de 2005 e 2010. “Antes a Amazônia tinha a estação úmida e a mais úmida, agora há uma estação seca”, diz Nobre. Os danos dessas secas na floresta não foram aniquiladores porque ela consegue se regenerar, mas o acúmulo dos danos aos poucos erode essa capacidade. Um efeito importante que já se observa, previsto há 20 anos por modelos climáticos, é umprolongamento da estação seca, que tem prejudicado a produção agrícola em porções do estado do Mato Grosso. A grande preocupação é que se chegue a um ponto de não retorno, em que a floresta já não consiga produzir chuva suficiente para suprir nem a si própria. Trabalhos de modelagem que levam em conta clima e vegetação indicam que esse ponto será atingido quando 40% da área original de floresta for perdida, um número que não é unânime. Segundo o relatório de Nobre,20% da floresta já foi cortada e outros 20%, alterados a ponto de terem perdido parte de suas propriedades.
© GERARD MOSS / PROJETO RIOS VOADORES
Rios voadores: correntes de vapor-d’água que se formam sobre a floresta amazônica exportam chuvas para a região Sul do Brasil
Rios voadores: correntes de vapor-d’água que se formam sobre a floresta amazônica exportam chuvas para a região Sul do Brasil
Se a teoria da bomba biótica estiver correta, os efeitos desse ponto de não retorno devem ser mais graves do que a savanização proposta pelo climatologista Carlos Nobre, irmão mais velho de Antonio (ver Pesquisa FAPESPnº 167). “Se a floresta perder a capacidade de trazer a umidade do oceano, a chuva na região pode cessar por completo”, diz o Nobre caçula. Sem água para sustentar uma savana, o resultado poderia ser uma desertificação na Amazônia. Se isso ocorrer, o cenário que ele infere para o Sul e o Sudeste do país poderia ser semelhante ao de outras regiões na mesma latitude: tornar-se um deserto.
Antonio Nobre não se arrisca a falar muito sobre São Paulo. “Meu relatório é sobre a Amazônia.” Mas ele acredita que a seca por aqui não independe do que acontece no Norte. Em sua opinião, foi possível devastar boa parte da mata atlântica sem sentir uma redução nas chuvas porque a Amazônia era capaz de suprir a falta de água na atmosfera local. Mas isso já não parece acontecer mais. Ele aproveita o ensejo para sugerir que não apenas a floresta amazônica, mas também a que acompanhava a costa de quase todo o Brasil precisa ser recuperada imediatamente. Se não for por outro motivo, o esgotamento a que chegaram as represas que alimentam boa parte da população paulista deveria bastar como argumento.
A exportação de água desde a Amazônia para outras regiões do Brasil, sobretudo o Sudeste e o Sul, é uma realidade, por meio do fenômeno conhecido como rios voadores (ver Pesquisa FAPESP nº 158). Um indício dessa linha direta foram as intensas chuvas no sudoeste da Amazônia no início de 2014, praticamente o dobro do volume habitual, ao mesmo tempo que São Paulo passava pelo pior momento de uma seca histórica. “A chuva ficou presa em Rondônia, no Acre e na Bolívia por causa de um bloqueio atmosférico, algo como uma bolha de ar que impedia a passagem da umidade. Isso criou uma estabilidade atmosférica, inibiu a formação de chuvas e elevou as temperaturas”, conta Marengo, agora pesquisador do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden). Ele é coautor de um artigo liderado por Jhan Carlo Espinoza, do Instituto Geofísico do Peru, que está em processo de publicação pela Environmental Research Letters e é parte dos resultados do programa Green Ocean (GO) Amazon, que tem apoio da FAPESP.
Não é possível, porém, afirmar o quanto essa relação determina a estiagem paulista. “Ainda não se sabe calcular quanto das chuvas do Sudeste vem da Amazônia nem quanto chega aqui trazido por frentes frias vindas do Sul, pela umidade carregada por brisas marinhas ou pela evaporação local”, diz. Para ele, o desmatamento pode ter um impacto no longo prazo, mas ainda é impossível dizer se ele está relacionado com a seca atual. “O Sudeste pode não virar um deserto”, pondera, “mas os extremos climáticos podem se tornar mais intensos”. Estudos usando modelos climáticos criados pelo grupo de Marengo já previam uma redistribuição do total das chuvas, com um volume muito grande em poucos dias e estiagens mais prolongadas, algo que já tem sido observado no Sudeste e no Sul do país nos últimos 50 anos.
Além desse efeito a distância, em escala nacional, a relação entre vegetação e recursos hídricos também se dá numa escala mais local, de acordo com o engenheiro agrônomo Walter de Paula Lima, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP) e coordenador científico do Programa Cooperativo de Monitoramento Ambiental em Microbacias (Promab) do Instituto de Pesquisas e Estudos Florestais. Em seus estudos sobre o efeito das florestas (ou sua remoção) em microbacias hidrográficas, ele mostrou que a mata ciliar, que acompanha os cursos de água, ajuda a manter a boa saúde de pequenos rios. “O sistema Cantareira, que abastece São Paulo, é formado por milhares de microbacias”, conta. “As que estão mais degradadas não contribuem para o manancial.” Essa avaliação, porém, carece de dados experimentais concretos. Segundo Lima, para se saber exatamente o efeito das matas ciliares nos mananciais seria necessário estudar uma microbacia experimental em que se possa medir propriedades dos cursos d’água com e sem a proteção de floresta, sem que haja outros fatores envolvidos. Um quadro praticamente inatingível.
Uma experiência prática que reforça a importância de se preservar as matas ciliares para a manutenção dos recursos hídricos é relatada pelo biólogo Ricardo Ribeiro Rodrigues, da Esalq, especialista em recuperação de florestas nativas. Ele conta que há 24 anos a água desapareceu da microbacia de Iracemápolis, município no interior paulista. A prefeitura buscou ajuda na Esalq, e o grupo de Rodrigues implementou um projeto de conservação de solo da microbacia e de recuperação da mata ciliar que deveria estar ali. “Fui lá recentemente e levei um susto”, conta o pesquisador. O nível da represa está um pouco mais baixo, mas tem água suficiente para continuar abastecendo Iracemápolis, que teve sua população triplicada nesse período. “Toda a região está com problemas de falta de água, mas Iracemápolis não.”
As florestas afetam a saúde dos recursos hídricos por meio de sua influência nas chuvas, mas também tem importância a sua relação com as águas subterrâneas. O engenheiro Edson Wendland, professor no Departamento de Hidráulica e Saneamento da USP de São Carlos, estuda justamente o que acontece com a recarga do aquífero Guarani quando o cerrado é substituído por culturas como pastagem, cana-de-açúcar, cítricos ou eucalipto. O trabalho tem sido feito na bacia do Ribeirão da Onça, no município de Brotas, interior paulista, estudada desde os anos 1980.
Por meio de poços de monitoramento e estações climatológicas, a ideia é detalhar, antes que não sobre mais vegetação original de cerrado por ali, como se dá a recarga do aquífero Guarani sob diferentes regimes de uso do solo. “Não é possível gerenciar o que não se conhece”, diz Wendland sobre uma das fontes de água subterrânea mais importantes do Brasil. O aquífero é uma camada porosa de rochas na qual se infiltra a água das chuvas, depois liberada lentamente para os rios. Essa diferença de tempo entre o abastecimento e a descarga, consequência do trajeto lento da água pelo meio subterrâneo, é o que garante perenidade aos rios, que dependem dessa poupança hídrica.
© LÉO RAMOS
No fim de novembro o sistema Cantareira tinha água no reservatório Paiva Castro...
No fim de novembro o sistema Cantareira tinha água no reservatório Paiva Castro…
O grupo de Wendland tem mostrado, por exemplo, que a disponibilidade de água diminui quando se substituem as pequenas árvores retorcidas do cerrado, adaptadas a viver sob estresse hídrico, por eucaliptos, que consomem bastante água e em poucos anos atingem o tamanho de corte. Medições feitas entre 2004 e 2007 mostram que as taxas de recarga têm relação íntima com a intensidade da precipitação e o porte das culturas agrícolas nessa região onde o cerrado está praticamente extinto, de acordo com artigo aceito para publicação nos Anais da Academia Brasileira de Ciências.
Isso não significa, porém, que os eucaliptos sejam vilões incondicionais. O impacto de árvores de grande porte depende, em parte, da profundidade do aquífero no ponto em que estão plantadas. Segundo Lima, os mais de 20 anos de monitoramento contínuo feito pelo Promab mostraram que a relação entre espécies florestais e água não é constante. “Onde a disponibilidade é crítica, um elemento novo pode secar as microbacias”, explica. “Mas onde o balanço hídrico e climático é bom, a diminuição de água nem é sentida.” Essas conclusões deixam claro que é necessário fazer um zoneamento de onde se pode plantar e onde a prática seria nociva, um planejamento que não existe no Brasil.
Para Wendland, a importância de entender a relação entre o cerrado e os aquíferos é crucialporque as nascentes da maioria das grandes bacias hidrográficas do país estão no domínio desse bioma. Além da importância como recurso hídrico, algumas dessas bacias – do Paraná, do Tocantins, do Parnaíba e do São Francisco – são as principais fornecedoras de água para geração de energia elétrica no Brasil.
Em pouco mais de meio século, metade da área do cerrado foi desmatada e deu lugar a atividades agrícolas. Para avaliar o efeito dessa alteração no uso do solo sobre a disponibilidade hídrica, o doutorando Paulo Tarso de Oliveira, do grupo de São Carlos, fez um estudo usando dados de sensoriamento remoto em toda a área desse bioma. Com os sensores, é possível avaliar não só a alteração da vegetação, mas também quantificar as precipitações, os índices de evapotranspiração pelas plantas e estimar a variação de armazenamento de água. Segundo artigo publicado em setembro de 2014 na Water Resources Research, os dados indicam uma redução do escoamento por causa de atividades agrícolas mais intensas.
© LÉO RAMOS
... enquanto a seca  era evidente no Jacareí/Jaguari
… enquanto a seca
era evidente no Jacareí/Jaguari
O desmatamento e o uso agrícola do solo têm importância, mas Wendland afirma que o maior problema para a recarga do aquífero hoje é a redução nas chuvas. “O aquífero supre a falta de precipitação por dois ou três anos, depois já não consegue manter o escoamento de base nos rios”, diz. Nos últimos anos as precipitações da estação chuvosa foram abaixo da média, o que diz os resultados observados. Explica também, segundo ele, fenômenos alarmantes como o esgotamento da principal nascente do rio São Francisco, que permaneceu seca por cerca de três meses e só voltou a jorrar água no final de novembro.
O desafio do gerenciamento das águas subterrâneas, que representam 98% da água doce do planeta, tem outras particularidades em zonas urbanas, onde pode ser um recurso crucial. Segundo o geólogo Ricardo Hirata, do Instituto de Geociências (IGc) da USP, 75% dos municípios paulistas são abastecidos, em parte ou completamente, por essas águas. Isso inclui cidades importantes do estado, com destaque para Ribeirão Preto, onde elas servem a 100% dos mais de 600 mil habitantes. Na escala nacional, outras cidades completamente abastecidas por águas subterrâneas são Juazeiro do Norte, no Ceará, Santarém, no Pará, e Uberaba, em Minas Gerais, de acordo com o livro Águas subterrâneas urbanas no Brasil, em processo de publicação pelo IGc e pelo Centro de Pesquisa em Águas Subterrâneas (Cepas).
Surpreendente nas cidades é que a água perdida pelo abastecimento público vai parar no aquífero. “A impermeabilização do solo diminui a penetração da água da chuva, mas as perdas compensam e superam essa redução e o saldo é uma recarga maior onde há cidades, em comparação com outras áreas”, explica Hirata. “Se analisarmos a água de um poço qualquer em São Paulo, metade será do aquífero e metade da Sabesp.” Ele estima que a capital paulista tenha quase 13 mil poços, todos particulares, muitos ilegais. “Existe uma legislação para gerenciamento desse recurso, mas ela não é seguida”, conta.
Um problema causado pelas cidades é a contaminação dos aquíferos por nitrato, devido a vazamentos no sistema de esgotos. Como a descontaminação é cara, os poços afetados acabam abandonados. Nas cidades em que são usados para abastecimento público, a solução é misturar água poluída à de poços limpos para que a qualidade total seja aceitável. “Em Natal não há mais água suficiente para mesclar”, alerta Hirata. O subterrâneo é fonte de 70% da água na capital potiguar.
Outro tipo de poluição importante vem da indústria, como a causada pelos solventes organoclorados. O geólogo Reginaldo Bertolo, também do IGc e diretor do Cepas, estuda como esse poluente se comporta no aquífero abaixo de Jurubatuba, na zona Sul paulistana, uma região industrial desde os anos 1950. “É um contaminante de difícil comportamento no aquífero”, conta. Nessa rocha dura, onde a água corre em fraturas, o composto mais denso do que a água se aprofunda e só para quando chega a um estrato impermeável. “São produtos tóxicos e carcinogênicos.” A poluição impede o uso da água subterrânea numa região onde a demanda é forte.
Em colaboração com pesquisadores da Universidade de Guelph, no Canadá, o grupo de Bertolo está mapeando esses poluentes para entender como ele se comporta e propor estratégias para eliminá-lo do aquífero. Para isso, o próximo passo é usar um sistema desenvolvido pelos canadenses para retirar amostras da rocha e instalar poços de monitoramento especiais. “O equipamento permite coletar água de mais de 20 fraturas diferentes numa mesma perfuração”, afirma. “Vamos fazer um modelo matemático para reproduzir o que acontece e fazer prognósticos.”
Bertolo alerta que é importante mapear melhor as águas subterrâneas e analisar sua qualidade, porque é um recurso que pode ser complementar nas cidades. “A água subterrânea é um recurso pouco conhecido.” A engenheira Monica Porto, da Escola Politécnica da USP, não acredita que seja possível expandir muito o uso dessas águas na Região Metropolitana de São Paulo. Em sua opinião, para ir além dos cerca de 10 metros cúbicos por segundo (m3/s) extraídos dos milhares de poços existentes, seriam necessários milhares de novas perfurações. “Mas esses 10 m3/s não podem faltar, precisamos cuidar deles.”
Monica, que já foi presidente e ainda integra o conselho consultivo da Associação Brasileira de Recursos Hídricos, pensa em maneiras de assegurar a segurança hídrica para a população. Faltar água está, de fato, entre as coisas mais graves que podem acontecer numa cidade. “Somos obrigados a trabalhar com uma probabilidade de falha muito baixa.” Segundo ela, em 2009 o governo paulista encomendou a uma empresa de consultoria um estudo sobre o que precisaria ser feito para garantir o suprimento de água. O estudo ficou pronto em outubro de 2013, já em meio à mais importante crise hídrica da história do estado. Monica explica que é impossível considerar a Grande São Paulo de forma isolada, porque não há mais de onde tirar água sem disputar com vizinhos. Por isso, o estudo abrange a megametrópole, que engloba mais de 130 municípios e uma população de 30 milhões de pessoas.
As obras necessárias à melhoria da segurança hídrica já começaram, com um sistema para recolher água do rio Juquiá, no Vale do Ribeira, que deve ficar pronto em 2018. Está em fase de licenciamento ambiental a construção das barragens de Pedreira e Duas Pontes, que devem abastecer a região de Campinas. “Manaus e Campinas são as únicas cidades do Brasil com mais de um milhão de pessoas que não têm reservatório de água”, conta Monica. Não faz falta a Manaus, às margens do rio Amazonas, mas faz a Campinas, que depende do sistema Cantareira. Ela, que em casa “faz das tripas coração” para economizar água, afirma que a crise atual é importante para conscientizar a população sobre a necessidade de se reduzir o consumo. Também ressalta a importância do conjunto de medidas que precisará ser revisto em caráter emergencial. “Temos que aprender pela dor”, diz Monica, que costuma brincar que é melhor que não chova muito para não afastar a instrutiva crise. “Mas, se não chover muito em breve, vou parar de brincar: precisa chover.”
Projetos1. Entendimento das causas dos vieses que determinam o início da estação chuvosa na Amazônia nos modelos climáticos usando observações do GoAmazon e chuva (13/50538-7); Pesquisador responsável José Antonio Marengo Orsini (Cemaden);Modalidade Auxílio Regular a Projeto de Pesquisa – GoAmazon; Investimento R$ 57.960,00 (FAPESP).
2. Estabelecimento do modelo conceitual hidrogeológico e de transporte e destino de compostos organoclorados no aquífero fraturado da região de Jurubatuba, São Paulo (13/10311-3); Pesquisador responsável Reginaldo Antonio Bertolo (IGc-USP);Modalidade Auxílio Regular a Projeto de Pesquisa; Investimento R$ 502.715,27 (FAPESP).
Artigos científicosMAKARIEVA, A. M. et alWhy does air passage over forest yield more rain? Examining the coupling between rainfall, pressure and atmospheric moisture contentJournal of Hydrometeorology. v. 15, n. 1, p. 411-26. fev. 2014.
MAKARIEVA, A. M. et alWhere do winds come from? A new theory on how water vapor condensation influences atmospheric pressure and dynamicsAtmospheric Chemistry and Physics. v. 13, p. 1039-56. 25 jan. 2013.
ESPINOZA, J. et alThe extreme 2014 flood in South-western Amazon basin: The role of tropical-subtropical South Atlantic SST gradientEnvironmental Research Letters. v. 9, n. 12. 8 dez. 2014.
WENDLAND, E. et alRecharge contribution to the Guarani Aquifer System estimated from the water balance method in a representative watershedAnais da Academia Brasileira de Ciências. no prelo.
OLIVEIRA, P. T. S. et alTrends in water balance components across the Brazilian CerradoWater Resources Research. v. 50, n. 9, p. 7100-14. set. 2014.